Brasil ajuda Nigéria a aumentar produção leiteira com raça Girolando

Brasil ajuda Nigéria a aumentar produção leiteira com raça Girolando

O projeto determina o melhoramento genético do rebanho nigeriano por meio de técnicas como inseminação artificial, edição genética e outras biotecnologias.

Produtores de leite da Nigéria, na África Ocidental, estão inseminando vacas das raças nigerianas Bunaji e Gudali com sêmen da raça brasileira artificial Girolando. Esse trabalho faz parte de uma parceria com a Embrapa, e o objetivo é alavancar a produção de leite no país, que é em média de dois litros por dia por vaca. Segundo o diretor da Agência Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento em Biotecnologia (NABDA) da Nigéria, Abdullahi Mustapha, com a criação e o melhoramento genético dos rebanhos locais, a pecuária leiteira nigeriana pode aumentar a produção diária para 10 a 15 litros por vaca.

“Já iniciamos a inseminação artificial do gado nigeriano com sêmen Girolando do Brasil”, conta Mustapha. Mais de 600 vacas foram inseminadas e, segundo o  pesquisador  da Embrapa Gado de Leite  Marcos Vinícius GB Silva , já nasceram 250 bezerros F1 (meio-sangue de primeira geração) da raça Girolando/Nigeriana. A expectativa inicial é realizar 2.000 inseminações em cem fazendas que fazem parte do projeto.

Oyekanmi Nash,  diretor de genética, genômica e pesquisa de bioinformática da NABDA, diz que os fazendeiros nigerianos esperarão as novas vacas entrarem em produção para substituir gradualmente o rebanho. Segundo ele, a princípio, as novas vacas produziriam entre cinco e dez litros de leite e progrediriam sem perder a boa adaptabilidade das espécies nigerianas às condições locais.

O próximo passo da NABDA é realizar a análise genômica das vacas F1 para identificar quais características os animais resultantes do cruzamento herdaram de seus pais e prever a produção potencial de leite das novas vacas.

FAO e Embrapa na África

O projeto “Biotecnologias para a produção sustentável de leite na África” ​​foi desenvolvido pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), com a presença da Embrapa. A Associação Brasileira de Criadores de Girolando participa indiretamente do projeto com informações sobre o pedigree dos touros e outros dados zootécnicos. Enquanto isso, a Nigéria seleciona propriedades, treina inseminadores e fornece suporte para obtenção e coleta de dados.

O projeto determina o melhoramento genético do rebanho nigeriano por meio de técnicas como inseminação artificial, edição genética e outras biotecnologias. O objetivo é melhorar a viabilidade econômica e a sustentabilidade da produção leiteira em pequena escala na África Subsaariana, usando raças de gado locais, que já estão adaptadas às condições da região. A parceria deve ser estendida em breve para incluir transferência de tecnologia sobre pastagens, alimentos e manejo.

Foto: Marcos Vinícius GB Silva

Ganhos para ambos os países

Embora o projeto seja de grande importância para a Nigéria, ele também é bom para o Brasil. “Além de aumentar as exportações de sêmen, embriões e animais Girolando, estamos exportando uma tecnologia de ponta desenvolvida pelo Brasil: a avaliação genômica da raça Girolando”, afirma o pesquisador. Silva também diz que a corporação está cumprindo seu papel, já que a África é uma das prioridades da Embrapa quando o assunto é cooperação internacional.

Ações como essa devem ser expandidas para outros países da África e do Oriente Médio. A Arábia Saudita, por exemplo, já demonstrou interesse em participar do projeto, e uma proposta semelhante já foi submetida às autoridades daquele país. Além de exportar sêmen e tecnologia, outra vantagem para a pecuária nacional é que se abre um grande mercado para a venda de animais e embriões para os criadores brasileiros.

Um gigante na África

A Nigéria tem cerca de 210 milhões de habitantes, e é o país mais populoso do continente africano e o sexto mais populoso do mundo. A previsão é que até 2050 o país se torne uma das 20 maiores economias do mundo. No entanto, a maioria da população nigeriana ainda vive em pobreza absoluta. Mustapha relata que as crianças nigerianas consomem menos de 10% da ingestão recomendada de leite.

O país importa cerca de US$ 1,5 bilhão em laticínios anualmente, mas Mustapha acredita que a Nigéria pode ser uma exportadora de leite para outros países africanos. “Temos um grande rebanho bovino, capacidade para alimentá-lo e pesquisadores em condições de tornar as raças nigerianas mais produtivas”, afirma. “Muitos países transformaram geneticamente seus rebanhos e estão produzindo leite em maior quantidade e melhor qualidade, e nós também podemos fazer isso”, conclui.

 

Girolando: a revolução brasileira na pecuária leiteira tropical

O desenvolvimento da raça sintética Girolando, resultante do cruzamento das raças Gir e Holandês-Frísia, foi definido pelo pesquisador da Embrapa Rui da Silva Verneque como o “milagre da pecuária leiteira brasileira”. A raça Holandesa-Frísia, taurina holandesa Bos taurus, tem o maior volume de produção, resultado de muitos séculos de seleção. No entanto, por serem oriundos de um clima temperado europeu, os animais são mais vulneráveis ​​ao calor e às doenças tropicais. Já a raça zebuína (Bos indicus) Gir é originária das regiões tropicais da Índia, e é mais adaptada ao calor e aos endo e ectoparasitas.

Com o objetivo de obter o melhor das duas raças, em 1989 o então Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento aprovou a raça sintética “Girolando”. Que tinha como objetivo fornecer ao Brasil uma genética bovina produtiva e adaptada às condições tropicais, combinando o melhor das raças Gir e Holandesa. Menos de uma década depois, em 1997, em parceria com a Associação Brasileira de Criadores de Girolando, a Embrapa Gado de Leite criou o Programa de Melhoramento Genético e Melhoramento Genético do Girolando (PMGG).

O objetivo do PMGG é avaliar animais para produção de leite e 32 características de importância econômica, incorporando novos aspectos de avaliações, resultados, tecnologias e informações para criadores a cada ano. Após uma década do Programa, além dos testes de progênie, os criadores também passaram a receber informações sobre genótipos, marcadores moleculares, pontuação linear (Girolando Linear Assessment System – SALG) e avaliação genética para idade ao primeiro parto, além da avaliação genômica de fêmeas da raça.

Nos últimos anos, a raça Girolando passou por uma revolução. Em 2000, a produção média de leite da raça em até 305 dias atingiu 3.683 kg; então, em 2023, esse indicador subiu para 6.930 kg, o que representa um aumento de aproximadamente 170% no período de 22 anos. O número de características avaliadas foi expandido de apenas três em 2020 para 33 em 2023, além de outros 12 indicadores e compostos.

Outro ponto importante se refere ao comércio de sêmen no Brasil, que cresce a cada ano, sendo o Girolando hoje a raça que mais se expande. Em 2023, foram produzidas 825.099 doses de sêmen, o que representa um aumento de mais de 11% em relação ao ano anterior. Segundo Silva, devido a esses e outros fatores, a raça Girolando vem ganhando cada vez mais reconhecimento nacional e internacional, tornando-se, portanto, a raça preferida para produção de leite em regiões tropicais. No Brasil, a raça tem grande aceitação e cerca de 80% do leite produzido no país é proveniente de animais Girolando, e eles conseguem manter um bom nível de produção em diferentes sistemas de manejo e condições climáticas.

A criação e o melhoramento genético da raça fizeram do Brasil referência mundial em genética bovina para produção de leite em regiões tropicais. Outra prova disso está nas exportações de genética bovina brasileira. “O tamanho desse mercado é incalculável, a julgar pelo interesse de alguns países, que incluem potências econômicas como a China, além de países africanos”, conclui o pesquisador.

Fonte: Embrapa Fotos: Marcos Vinícius GB Silva / Zineb Benchekchou