Consórcio de milho com capim colonião BRS Zuri reduz em cerca de 70% a infestação de plantas daninhas
Na pesquisa, foram observadas a redução da infestação de plantas daninhas e da ocorrência de buva (Conyza sumatrensis), espécie que possui indivíduos resistentes ao herbicida glifosato
Estudo da Embrapa Cerrados (DF) comprovou que o consórcio de milho com a BRS Zuri, cultivar de capim colonião (nome popular da espécie Panicum maximum), reduziu em 68% a infestação de plantas daninhas em comparação com o milho solteiro na entressafra agrícola (outono/inverno) do Cerrado brasileiro. A pesquisa reduziu ainda em 66% a ocorrência de buva (Conyza sumatrensis), uma espécie que possui indivíduos resistentes ao herbicida glifosato. Além disso, as produtividades do milho foram semelhantes e houve menor diversidade de plantas daninhas no consórcio.
Responsável pelo estudo “Levantamento fitossociológico de. plantas daninhas em áreas de milho com e sem consórcio com BRS Zuri”, a pesquisadora Núbia Maria Correia explica que a dificuldade de manejar espécies de plantas daninhas tolerantes ou resistentes a herbicidas exige mudanças não só na substituição ou inclusão de novos produtos no sistema de produção, como também no comportamento dos produtores, com a adoção do manejo integrado dessas plantas com o uso, na entressafra, de plantas de cobertura como as gramíneas forrageiras do gênero Urochloa (capins braquiárias) ou Panicum.
“Essa prática é importante, já que além de melhorias na qualidade física, química e biológica do solo, favorecerá o manejo de plantas daninhas, seja pela interferência das plantas vivas das espécies forrageiras ou pela cobertura morta depositada sobre o solo após a dessecação antes da semeadura da cultura de interesse”, afirma.
Já são conhecidos os efeitos dos consórcios de milho com a braquiária ruziziensis (U. ruziziensis), muito utilizados no Cerrado do Brasil Central, para o controle das plantas daninhas. No entanto, a pesquisadora observa que o uso de espécies como o capim colonião como planta de cobertura no período de entressafra na região, quando as chuvas são reduzidas e o acúmulo de massa de forragem fica comprometido, também é bastante promissor tanto para a formação de pastagem como de palhada para o Sistema Plantio Direto para a safra de verão seguinte.
“As plantas do colonião têm sistema radicular vigoroso e profundo, além de elevada tolerância à deficiência hídrica e absorção de nutrientes em camadas mais profundas do solo, desenvolvendo-se em condições ambientais desfavoráveis para a maioria das culturas de grãos e de espécies utilizadas para cobertura do solo”, aponta Correia.
Identificação e quantificação
Nesse sentido, o trabalho buscou identificar e quantificar as plantas daninhas presentes em duas áreas paralelas de milho safra – uma faixa de milho solteiro e outra de milho consorciado com o capim colonião BRS Zuri. As áreas foram semeadas no mesmo dia, em outubro de 2020, e receberam os mesmos tratos culturais. Na faixa do consórcio, a BRS Zuri foi semeada antes do milho.
Em julho, 72 dias após a colheita do milho, foi realizado o levantamento fitossociológico das plantas daninhas que emergiram nas duas faixas, com amostragem de 12 pontos aleatórios de 9 m2 em cada uma. Em cada ponto, foi realizada a avaliação visual da infestação, considerando, além da quantidade, a altura e o enfolhamento das plantas.
Foram identificadas 18 espécies de plantas daninhas infestando as duas faixas, distribuídas em 17 gêneros e oito famílias. A porcentagem de infestação de cada espécie foi estimada em função da cobertura do terreno pelas plantas. A partir desses valores, foram calculados outros parâmetros fitossociológicos.
Na faixa de milho solteiro, 17 espécies foram encontradas; na faixa de milho consorciado, 12. Capim-amargoso, poaia-branca, erva-de-santa-luzia, cordão-de-frade, apaga-fogo e macela-branca ocorreram somente na faixa de milho solteiro, enquanto o caruru foi identificado apenas na faixa de milho consorciado com BRS Zuri, e em um único ponto amostral. A família com maior número de espécies foi a Poaceae, com cinco (capim-carrapicho, capim amargoso, capim-colchão, capim-custódio e capim-pé-de-galinha), seguida por Asteraceae, com três (buva, mentrasto e macela-branca).
Forrageira conteve a buva e outras plantas daninhas de difícil controle
A buva (C. sumatrensis) foi a espécie mais frequente na faixa com milho solteiro, tendo sido encontrada nos 12 pontos de amostragem e apresentado os valores mais altos de infestação, representando a espécie de maior influência na comunidade de plantas infestantes. Frequente nas regiões Sul e Centro-Oeste do Brasil, a buva, que tem três espécies identificadas no País, é uma planta daninha que se alastra rapidamente com a disseminação das sementes pelo vento, comprometendo a produtividade de lavouras de milho, soja e trigo ao interferir no desenvolvimento das plantas.
Núbia explica que mesmo tendo sido cortadas durante a colheita do milho, as plantas de buva não morreram. “Pelo contrário, elas rebrotaram a partir do caule ceifado em várias direções. Portanto, não se trata da emergência de novas plantas após a colheita do milho, mas de plantas com certo desenvolvimento no momento da colheita”. Segundo a pesquisadora, essas plantas emergiram a partir do mês de abril, quando a umidade, a luminosidade e a condição térmica favoreceram a germinação das sementes. “Nas áreas agrícolas com histórico de ocorrência de buva, a espécie terá grande potencial de infestação das áreas após a colheita do milho primeira safra”, observa.
Já na faixa de milho consorciado com BRS Zuri, nenhuma das 12 espécies de plantas daninhas avaliadas foi encontrada em todos os pontos amostrais, sendo que a buva foi observada em apenas seis pontos. A espécie mais regular e predominante foi a trapoeraba (Commelina benghalensis), encontrada em nove pontos, mas com infestação considerada baixa.
A poaia-branca (Richardia brasiliensis) e a erva-de-santa-luzia (Chamaesyce hirta) – duas espécies não encontradas na faixa com o consórcio do milho com o colonião BRS Zuri – são plantas daninhas naturalmente tolerantes ou de difícil controle pelo glifosato, principal herbicida usado nas culturas de soja e milho, seja em dessecação (antes da semeadura) ou após a semeadura em pós-emergência nas cultivares transgênicas tolerantes ao produto.
Correia lembra que o glifosato não foi pulverizado nas faixas de plantio do experimento, e as plantas daninhas encontradas tinham sementes no solo que germinaram e emergiram próximo ou após a colheita do milho, infestando as áreas. Ela observa que esse é um fato comum nas áreas agrícolas quando o controle químico é a única estratégia de manejo das plantas daninhas.
“Próximo ao momento da colheita da cultura, o aumento da incidência de luz no solo, associado à sua umidade, favorece a germinação das sementes e a consequente emergência das plântulas. Mas quando há uma cobertura viva junto à colheita do milho, essa germinação não ocorre, principalmente pela falta de luz, desfavorecendo a reinfestação da área agrícola”, explica a pesquisadora. “Isso é similar ao que aconteceu na faixa de milho consorciado com BRS Zuri, onde a cobertura viva interferiu no estabelecimento das plantas daninhas”, completa.
Outra espécie importante observada apenas na faixa de milho solteiro foi o capim-amargoso, considerado uma das principais plantas daninhas resistentes ao glifosato no Brasil. “Nesse caso, tratam-se de biótipos que foram selecionados dentro de uma população suscetível, que não são mais controlados pelo herbicida”, explica Correia, acrescentando que o indivíduo resistente também pode ser introduzido na área agrícola pela disseminação natural – as sementes são levadas pelo vento, por exemplo – ou pelas colhedoras de grãos.
As plantas de capim-amargoso da área não foram avaliadas quanto à resistência ao glifosato. “Mas, independentemente disso, a presença da BRS Zuri em consórcio com o milho desfavoreceu o estabelecimento das plantas de capim-amargoso na faixa consorciada, o que reforça a ideia de que para o manejo eficaz dessa espécie, sejam plantas suscetíveis ou resistentes ao herbicida, a permanência da cobertura viva no solo na entressafra é uma das estratégias possíveis”, comenta a pesquisadora.
Outro aspecto observado foi que quando a planta de cobertura está distribuída de maneira uniforme sobre o solo não há espaço para o estabelecimento das plantas daninhas. No experimento, como a semeadura da BRS Zuri foi feita a lanço (sistema mais utilizado no Plantio Direto, por conseguir melhor distribuição espacial das sementes), a cobertura ficou desuniforme em alguns locais, variando de 40% a 95%, com percentual médio de 69%. Nas áreas com maior presença da forrageira, a infestação de plantas daninhas foi menor e vice-versa. “Com o pleno crescimento das plantas, a cobertura do solo nesses locais tende a aumentar”, observa Correia.
Na faixa de milho consorciado, a infestação total – soma dos valores da infestação de cada espécie (notas de 0 a 100% por espécie) avaliada nas 12 unidades amostrais – foi de 112% e a infestação média foi de 9% por cada unidade amostral. Já na faixa de milho solteiro, a infestação total foi de 348% e a infestação média 29%. Na comparação das infestações das duas faixas, houve redução de 68% na infestação de plantas daninhas na faixa de milho consorciado com BRS Zuri, e de 66% apenas para plantas de buva. Também foram observadas mudanças na dinâmica das plantas daninhas, com o desfavorecimento da ocorrência de algumas espécies, que não foram encontradas na área de consórcio analisada.
“Os dados do estudo reforçaram, portanto, a importância da cobertura viva do solo na entressafra agrícola durante o período de outono/inverno para reduzir a infestação de plantas daninhas de difícil controle como buva, capim-amargoso, poaia-branca e erva-de-santa-luzia”, conclui a pesquisadora.
Fonte: Embrapa Foto: Robélio Marchão