Bioeconomia é aposta para uso da Caatinga no desenvolvimento do Semiárido
Este é um modelo de produção com base no uso de recursos biológicos, em substituição a recursos fósseis e não renováveis, tendo em vista gerar valor com sustentabilidade ambiental. Tem sido um dos focos de atuação estratégica da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), que busca oferecer soluções para os grandes problemas da agricultura nacional.
Localmente, a Embrapa Semiárido – centro de pesquisa da Empresa que atua na região semiárida –, já vem trabalhando há décadas com componentes da bioeconomia, ainda antes desse conceito ganhar a relevância que tem hoje. “Hoje temos uma estratégia institucional de conceituar e organizar as várias iniciativas que apontam para a bioeconomia de maneira mais sistemática, de forma que as pessoas possam comunicar ao público a importância que é a bioeconomia para um bioma como a Caatinga e as oportunidades que isso nos traz, bem como quais são as grandes frentes que podem apoiar esse tema, fortalecendo o desenvolvimento sustentável da região”, destaca a chefe-geral da Embrapa Semiárido, Maria Auxiliadora Coêlho de Lima.
Entre as inúmeras e inovadoras possibilidades de uso dos recursos biológicos da Caatinga que vêm sendo treinadas pela Embrapa está a prospecção de microrganismos naturalmente não apresenta bioma com potencial para a produção de insumos biológicos, principalmente para a agricultura. Exemplo disso é a identificação e o estudo de bactérias nativas capazes de fazer a fixação biológica de nitrogênio. Essas bactérias suprem a demanda de nitrogênio das culturas de forma mais econômica e com menor uso de outras fontes, por exemplo a uréia.
Além dos microrganismos, a flora da Caatinga também apresenta potenciais de utilização nas mais diversas áreas. Um importante uso desses recursos que vem sendo treinado pela Embrapa é para a eliminação de óleos essenciais de plantas nativas para controle de pragas e doenças na agropecuária, além do uso na indústria de cosméticos ou farmacológica.
As plantas nativas também vêm sendo tradicionais utilizadas pela população local para diferentes finalidades. Entre esses usos está o extrativismo e o cultivo de fruteiras nativas e, a partir delas, a elaboração de produtos diversos, a exemplo de doces, compotas e bebidas, como sucos e fermentados. Muitos já foram desenvolvidos e estão no mercado, outros vêm sendo formulados ou têm seus processos de desenvolvimento aprimorados pela pesquisa, em parceria com o setor produtivo.
“A gente tem percebido que o tema da bioeconomia começa a se lançar agora nesse processo de pesquisa, de visibilização, mas é algo que já vem sendo praticado e potencializado, principalmente pelos agricultores e agricultores, que hoje têm uma pesquisa como aliada para dar uma visibilidade maior, mostrar o potencial que a Caatinga tem”, ressalta Nívea Rocha, coordenadora administrativa do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada ( IRPAA ).
Cadeias para a produção de leite, queijos e carnes, em especial de caprinos e ovinos, também são tradicionalmente estruturadas com base no uso da Caatinga como fonte de alimentos. A Embrapa, além de fornecer sistemas de produção mais sustentáveis, também atua na identificação de espécies nativas com potencial para cultivo como forrageiras, por serem nutritivas e tolerantes à seca.
O produtor Luís Almeida Santos reforça que é importante reunir tanto esse conhecimento acadêmico, científico, com os conhecimentos tradicionais dos agricultores, das comunidades tradicionais, destacando, em especial, as comunidades de fundo de pasto, que utilizam práticas sustentáveis para a produção animal com base sem bioma Caatinga. Para ele, a participação dos produtores junto com pesquisadores e tomadores de decisões é importante “pra gente conseguir olhar juntos pra esses desafios e pensar como que, através da bioeconomia, a gente consegue reduzir desigualdades e valorizar a Caatinga em pé, por um processo de melhoria das condições de vida da população, principalmente da população rural”.
Diversas outras perspectivas de uso do Bioma também foram alvo de pesquisas da Embrapa e de empresas e instituições parceiras, como a criação de abelhas nativas, o uso florestal, madeireiro, energético, ornamental, entre outros. Todos esses temas foram discutidos durante o Seminário de Bioeconomia na Caatinga, realizado pela Embrapa entre os dias 22 e 23 de maio, em Petrolina-PE. O evento foi organizado para ampliar a discussão sobre a bioeconomia na Caatinga em conjunto com diferentes parcerias, ao mesmo tempo em que se comemora o Dia Internacional da Biodiversidade, em 22 de maio.
Bioeconomia no Brasil e no mundo
O tema também levou o Brasil para o cenário global, com a proposição de um grupo temático para debater questões sobre a bioeconomia, chamado de GIB (Iniciativa G20 de Bioeconomia, na sigla em inglês). Segundo a Diretora-Executiva de Negócios da Embrapa, Ana Euler, o que se propõe é pensar “um novo modelo de economia que não somente olhe para a descarbonização dos setores produtivos, mas que tenha um pilar de inclusão socioprodutiva, de redução de desigualdades e principalmente de conservação, valorização e regeneração da nossa biodiversidade.”
Para ela, “o Brasil tem uma grande oportunidade, sendo um dos países mais megabiodiversos do planeta, e esse é um momento estratégico para o posicionamento da importância de se pensar nessa transição ecológica tão necessária para o momento em que o mundo vive desafios globais de extremos climáticos, como acontecem no sul do Brasil, e de mudanças climáticas como um todo”.
Ana Euler destaca, também, a importância de olhar a Caatinga como um ecossistema unicamente brasileiro, de uma biodiversidade extraordinária e pouco conhecida. “Vejo que já existem várias cadeias produtivas ligadas à biodiversidade, à agricultura familiar ou à agricultura de uma forma mais ampla que já vêm sendo trabalhos aqui. Mas como isso se associa a uma estratégia de bioeconomia e uma estratégia de convivência com a seca, resiliência, adaptação e mitigação das mudanças climáticas?”. Para ela, o principal desafio é pensar, de forma integrada e coordenada, um grande plano de pesquisa, desenvolvimento, inovação, mercado e negócios para o bioma, agregando todo esse ecossistema de atores e de oportunidades.
A partir das experiências com a bioeconomia na Amazônia, o chefe-geral da Embrapa Amazônia Oriental , Walkymário de Paulo Lemos, aponta que, “apesar das diferenças ecológicas entre os dois biomas, os desafios aparentemente semelhantes em termos de necessidade de organização das nossas leis , de uma maior compreensão de que de fato deve ser o modelo de bioeconomia que queremos para nossos territórios, onde as pessoas fazem parte dessa transformação”.
Ele acredita que as oportunidades também são múltiplas nesses dois territórios, e acredita que um grande vetor de transformação seja uma capacidade de agregar valor à diversidade da Caatinga de forma semelhante ao que ocorre na Amazônia. “Nós apostamos muito na busca de conhecimento, seja científico ou de nossas comunidades, para transformar essa mega riqueza biológica existente na Amazônia em riqueza social e econômica, sem nunca deixar de olhar aquela população que está lá convivendo diariamente com a floresta, protegendo- a e fazendo uso da mesma”.